O dia de São Valentin é uma das datas mais bonitas do ano. É quando os galináceos podem mostrar o tanto que gostam uns dos outros sem nenhum problema. Todos enviam e recebem cartõezinhos, serenatas e outras coisas românticas.
Todo mundo menos eu. Tô esperando até o último segundo de hoje para ver se recebo alguma coisa, mas parece que ninguém gosta de mim. Não acredito que em um galinheiro enorme como esse, nem uma mísera galinha tenha se lembrado de mim.
E olha que mandei cartõezinhos para todas. Enviei bilhetinhos, flores, chocolates. Até pra gorda com celulite eu mandei um recadinho amigável. Afinal, hoje é o dia que os solteiros esperam encontrar a galinha dos seus sonhos. Não que eu esteja tendo muita sorte nisso, mas ninguém pode dizer que não tentei.
Pra ter uma ideia, nem minha mãe me deu um abraço hoje. Aquela galinha me botou, ficou 21 dias me chocando, viu eu me tornando um frango e simplesmente ignorou a data de hoje. Isso é um sinal que vou ser mal amado pelo resto da vida. Tem pelo menos uma hora que eu estou sentado aqui no poleiro, olhando esperançoso pela janela, esperando alguma coisa acontecer e nada.
Os casais parecem rir da minha cara e curtem o dia como se eles fossem o centro das atenções. No meus sonhos, eu estaria lá em baixo de asas dadas com uma galinha bem gostosa. Nós dividiríamos uma pipoca, sentaríamos num banco e olharíamos os peixes no laguinho. Depois faríamos um sexo gostoso no meu poleiro, aproveitando o dia como ele deve ser aproveitado.
Mas sou frango demais pra conseguir uma companhia. Já estou até acostumando com isso. Todo ano é a mesma coisa. Me encho de esperanças no início de fevereiro e passo sempre em branco. Ano que vem será diferente, eu prometo! Ou não. No ritmo que as coisas andam, vou ficar é para tio mesmo.
Calma, alguém colocou um bilhete por debaixo da porta. Deixa eu ler: “Meu querido franguinho, queria muito passar esse dia com você, mas não tenho coragem de falar isso pessoalmente. Se quiser me encontrar, venha até a cerca agora que estarei esperando por você!”
Será que finalmente vou me dar bem? Só tem uma maneira de descobrir e essa maneira é dar uma passada na cerca. É só apressar o passo que vou chegar lá em um minuto. Já estou mega ansioso. Só espero que não seja… ah não! É aquela gorda com celulite de novo!
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Vou desativar meu antigo blog, o “Memórias de um frango”. Para isso, vou resgatar as crônicas que estavam postadas lá, dar uma repaginada e trazer para cá. Meu personagem nunca teve um bom histórico no quesito amoroso e eu não poderia deixar passar o Valentine’s Day em branco. Essa crônica é de 2009 e ainda há traços bem fortes da babaquice do personagem, que eu tentei amenizar com o tempo.
Começou a escrever em 2008 para fugir de uma rotina massante no galinheiro e descobriu que era bom naquilo. Ou pelo menos achava que era, já que nunca conseguiu dar nenhum beijo na boca por seus textos. Dizem por aí que continua virgem, mas ele nega.