Escrevo porque não tenho o dom do freestyle
O agora é a única coisa que vale
Se erra, conserta, volta pro tom, e segue o baile
Braza – Segue o Baile
Esta não é mais uma crônica sobre como é fazer aniversário em meio à pandemia. A situação atual não é das melhores, eu sei, mas não quero transformar este texto em uma lamentação contra a bactéria filha da puta. Estar há mais de 100 dias preso em casa tem seus impactos, mas a proposta aqui é olhar para o que passou e pensar no que vem por aí. É isso que vou fazer.
Quando escrevi a crônica de aniversário do ano passado, fiquei preocupado em ter sido otimista demais. Não é do meu feitio me sentir bem comigo mesmo, mas estava tranquilo como poucas vezes já havia estado. Era o retorno de saturno, alguns diriam. Como não acredito nessas coisas, decidi só colocar tudo em palavras. Olhando para os 365 dias que passaram desde então, vejo que, felizmente, o sentimento se manteve.
É estranho falar que se está tranquilo quando uma pandemia tira a vida de milhares de pessoas, mina nossa sanidade a cada dia e ameaça nossos empregos. Ou quando o governo federal se esforça para nos matar de diferentes maneiras. Não está sendo fácil. Preciso ser sincero e revelar que as últimas semanas foram bem difíceis. Tive umas quebras mentais que não tinha há muito tempo. Mas, diferente das outras vezes, sei que vai passar, qual o problema e como lidar com ele. Consigo falar abertamente com meus amigos e tenho o suporte necessário. Está tudo sob controle, embora muitas vezes pareça que não.
O que me faz acreditar nisso é ver tudo o que aconteceu nesse ano que passou. O primeiro dos 30 foi um período intenso, em que me desafiei, fui desafiado e consegui reagir bem à maioria das situações. Tive que tomar decisões que afetariam minha vida de forma radical. Estive com meus amigos e com minha família em todos os momentos importantes. Saí muito, conheci pessoas e estou descobrindo um novo eu. Trabalhei muito e tenho trabalhado todos os dias para entregar um bom resultado. Tenho feito tudo o possível para ser uma pessoa melhor. Vejo a evolução disso ao longo do tempo e me sinto confortável com isso.
Mas essa tranquilidade vem da sensação cada vez mais constante de que um ciclo na minha vida está prestes a se encerrar. Não vou conseguir descrever bem aqui como é isso, mas há alguns meses estou com essa impressão. Estou próximo de uma mudança importante, mas ainda não sei o que é. Tenho algumas prisões e loopings mentais que nunca me deixaram ir em frente, mas pela primeira vez estou vendo um fim. Logo eu, que nunca fui muito bom com encerrar coisas.
O exemplo mais bobo é que estou muito próximo de terminar minha lista de livros não lidos. Quem me conhece há mais tempo sabe que sempre brinquei com isso. Era um plano distante, megalomaníaco, que achei nunca ser capaz de atingir. Mas agora faltam pouco mais de dez livros. Uma realidade que está logo ali. Em algum lugar entre os 31 e os 32 anos vou terminar. Isso me apavora e, ao mesmo tempo, me encanta.
Acho que é isso. Estou com um eterno sentimento de encantamento e medo. Não sei de onde vem e não consigo explicar o porquê. Mas estou curtindo. Ele está presente o tempo inteiro. Os livros são só um exemplo, mas é algo que permeia toda a minha vida. Algumas certezas que tinha estão se tornando dúvidas. Decidi testar coisas que eu nunca havia feito. Estou cheio de incertezas e, pela primeira vez, são incertezas boas.
Se quero uma coisa para os meus 31 é continuar me desafiando. Sei que o caminho é tortuoso e estou tateando em muitas coisas. Mas sei que tem uma mudança chegando. Ela está ali em alguma esquina, só esperando a última chavinha virar em meu cérebro. E cada dia sinto que esse dia está mais próximo.
Comecei a vida dentro de um laboratório de química, mas não encontrei muitas palavras dentro dos béqueres e erlenmeyers. Fui para o jornalismo em busca de histórias para contar. Elas surgem a cada dia, mas ainda não são minhas. Espero que um dia sejam.