Dia 08/08/08, às 08:08. Um simbolismo brega, o suficiente para fazer a granja inteira parar. Parecia feriado. E quando falo em parar, não tô brincando. As galinhas pararam de fofocar, o galo velho caquético parou de me encher o saco e o granjeiro até se esqueceu de dar comida pra gente. COMIDA! Como aquele filho da puta se esquece da comida? A festa de abertura estava até bonita, eu sei, mas se esquecer da gente é demais. Desgraçado!

Em meio aos roncos do meu estômago, reparei uma coisa curiosa: era a mesma pessoa em todos os papéis durante a cerimônia. Podem tentar me provar o contrário, vou manter minha ideia. Até porque não sei distinguir muito bem um chinês do outro. São todos iguais. Olhos puxados, pele amarela com falta de sol e cabelos pretos escorridos. Quando aqueles chineses colocaram as medalhas nos pescoços e acenaram, juro que fiquei tonto. Parecia clonagem. Deviam prender o Albieri, os planos dele saíram do controle. São todos idênticos. Depois os frangos é que são todos iguais.

E o pior, nem uma franguinha oriental bonita tinha. Passei a noite em claro por nada. Não só essa, mas todas as noites de competição. Em compensação, dormi durante o dia inteiro. Aliás, meu relógio biológico ainda não voltou ao normal. A expressão “levantar com as galinhas” nunca foi tão errada. Eu dormia junto com o nascer do sol e acordava para comer. Então dormia de novo, em um ciclo infinito de pura irresponsabilidade. Nem minha função de acordar o galinheiro eu cumpri.

Só voltava para a realidade quando começava mais uma madrugada olímpica. Como a granja é chique, tem SporTV1, SporTV2, SporTV3, SporTV Premium e SporTV Mega-ultra-hiper-max-excelente. Assim eu podia ver todos os jogos, sem exceção. Sabe aqueles esportes tipo “tiro deitado com carabina invertida acionada por uma cusparada a distância”? Pois é, esses eram os mais legais. Eu não sabia as regras, o narrador também não. Ficávamos eu, a televisão e o narrador calados. Reparei que valia medalha só quando já estavam todos no pódio.

Apesar disso, valeu a pena trocar meus horários. Posso dizer que vi um tal de Michael Phelps cair nas piscinas. Tenho medo dele, parece mais um tubarão do que uma pessoa. Também assisti ao tênis e tive certeza que Rafael Nadal é O cara. E as mulheres da ginástica artística? Que coisa impressionante. Minha máxima flexibilidade é esticar a asa e pegar o controle remoto. E evito ao máximo fazer isso para não me contundir. Mas gostei de verdade foi do futebol feminino. Não porque o Brasil levou um créu dos Estados Unidos na final, mas porque elas enfrentaram as norueguesas. Queria um time daqueles trabalhando aqui no galinheiro, acariciando minhas penas e lustrando meu bico.

Calma, me distraí. Qual era o assunto mesmo? Ah, o Brasil. Aliás, nem sei para que eu citei o Brasil nessa história. Ganhou três medalhas de ouro inesperadas? Bom para ele. Uma do menino nadador que não lembro o nome, que só ganhou o ouro porque o Phelps não competia nessa prova. Uma da Maurren Maggi no salto em distância (brilhante conquista individual, sem apoio nenhum do Brasil) e a outra foi com o time de vôlei feminino (finalmente!).

Quer saber de uma coisa? Os últimos quinze dias foram bons. Não dormi direito, não fiz nada de útil, mas assisti às Olimpíadas. Quer coisa melhor do que ficar à toa e ver televisão o dia todo? Tudo bem que nosso país ficou atrás de Belarus no quadro de medalhas, mas como nem sei onde é Belarus, vou ficar quieto.

Agora tenho que voltar aos meus afazeres normais. Não quero, vou emendar com as paralimpíadas e quero ver quem vai me proibir. Espero sinceramente que o granjeiro não tente me comer depois desse mês sem fazer nada.


Vou desativar meu antigo blog, o “Memórias de um frango”. Para isso, vou resgatar as crônicas que estavam postadas lá, dar uma repaginada e trazer para cá. Publicada ao fim das Olimpíadas de Pequim 2008, foi a primeira que escrevi como o Frango desde Reflexões de um frango. Foi o início de quase 100 crônicas com o personagem e que pretendo manter por um bom tempo ainda.