Ser o Frango Garanhão Reprodutor da granja é o trabalho dos sonhos pra muitos pintinhos. Comer, ter um poleiro bom e transar. Precisa de mais? A teoria é linda, eu sei, mas a prática é bem bosta. Acredita em mim, sei do que tô falando. Dentre as diversas torturas diárias, acordar cedo em pleno domingo ocupa um lugar especial. A única justificativa plausível pra se acordar cedo no domingo é ter uma arma apontada pra cabeça. Até um apocalipse zumbi pode esperar a sonequinha pra acontecer.
Se não fosse ruim o suficiente, acordo cedo pra ter aulas com aquele galo velho caquético. Ele me ensina as artes e ofícios de “como ser um galo de sucesso”. Parece nome de livro de auto-ajuda, mas é uma matéria. Pensando bem, era melhor ele escrever um livro e me mandar ler. Ia ser melhor. Odeio livros de auto-ajuda, mas odeio aquele velho e odeio ainda mais acordar domingo de madrugada.
Até porque é nesse horário que passa Fórmula 1. É uma tradição sagrada, porra. Assisto desde que sou pintinho e querem me dar trabalho no mesmo horário dela? Quando a corrida é de manhã, faço até o esforço de levantar cedo e assistir. Mas se a corrida for à tarde… ah, só me acordem na hora dela começar.
Mas não, aquele velho maldito vem me sacudir às 3 da manhã e atrapalha meus planos. Sabe aquela expressão “levantar com as galinhas”? Ela só funciona quando as levo pro meu poleiro e passamos a noite juntos. Caso contrário, não dá certo. Acordo antes das galinhas porque, pelo jeito, minha função é cantar pra acordá-las. TO-DOS-OS-DI-AS. Puta que pariu! Será que elas não conhecem a maravilhosa tecnologia do despertador?
Minha única esperança é aquele velhote perceber meu mau humor e me liberar mais cedo. O que é impossível, ele continua com um falatório interminável na minha cabeça. Inferno, o povo tá acordando só agora e eu aqui, com essas olheiras enormes de quem não dormiu direito e um humor ácido ao extremo.
Pra completar, a aula é no telhado. De lá consigo ver toda a movimentação da granja, com as galinhas saindo às ruas usando verde-amarelo, pendurando bandeirinhas do Brasil por todos os lugares… ué, estranho. Só tem jogo às 10 da noite, por que esse povo tá assim? A partida é agora e não fiquei sabendo? Droga, tô perdendo futebol! Aquele moribundo vai me prender o dia inteiro, tô até vendo. Já vou perder a corrida, mas perder o jogo é humilhação.
“Pare de olhar para a parada, se concentra na aula!”
Parada? Que parada? Vai ter parada gay e não me convidaram? Parei por um tempo até o raciocínio funcionar direito. “Parada… parada de sete de setembro? Mas sete de setembro não é feriado?
Merda. Odeio feriado no final de semana. Esse só o primeiro de muitos nesse semestre.
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Vou desativar meu antigo blog, o “Memórias de um frango”. Para isso, vou resgatar as crônicas que estavam postadas lá, dar uma repaginada e trazer para cá. Essa foi uma crônica do Frango escrita para o sete de setembro. Ainda estava procurando a voz do personagem, é a primeira vez que as aulas sobre “como ser um galo” aparecem, coisa que se repetiria muitas vezes no futuro.
Começou a escrever em 2008 para fugir de uma rotina massante no galinheiro e descobriu que era bom naquilo. Ou pelo menos achava que era, já que nunca conseguiu dar nenhum beijo na boca por seus textos. Dizem por aí que continua virgem, mas ele nega.