O sítio está em estado de alerta máximo. O chiqueiro foi cercado com arame farpado e está de quarentena. Os porcos estão desesperados. Uma pandemia está tomando conta do mundo. Histeria, máscaras cirúrgicas pelas ruas, pessoas morrendo por causa de gripe. Pronto, o cenário dos últimos dias já está montado. Mas isso te lembra alguma coisa? Eu tenho lembranças dolorosas com relação a isso.
Troque os porcos por frangos. Troque o México pela China. Pois é, a gripe aviária causou tanto alarde quanto essa maldita gripe suína. Todos se protegeram, ficaram desesperados para no final não acontecer nada. NADA.
Desculpem, tenho que fazer uma correção. A infeliz não se chama mais gripe suína, agora é Gripe-A. Sabe por quê? Porque as vendas de carnes de porcos estavam caindo por puro medo da população. E daí? Ninguém quis mudar o nome da gripe aviária, ninguém parou de comer carne de frango, meus parentes e amigos continuaram morrendo. Os porcos são mais importantes que os frangos?
Até tenho amigos suínos, mas eles nunca chegam aos pés dos galináceos. Vamos pensar como seres humanos por um instante. Para que serve um porco, além de ser morto e comido? Para nada! Agora pense nos frangos. Eles são boas companhias para as piores horas. São limpos, comem pouco, não fazem bagunça, cabem em uma caixa de sapato e ainda servem como animal de estimação. As galinhas botam ovos, são gostosas e, em última hipótese, podem ser comidas (não tente fazer isso em casa).
Na verdade, nem sei o motivo de tanto stress. Acho que estou com inveja desses porcos infelizes por eles estarem tanto na mídia. Desde a nossa gripe acabou, só o Globo Rural fala sobre a nossa vida. Antes era entrevista no Jô, participação na Ana Maria Braga, notícia urgente no Jornal Nacional, fonte dos documentários da Discovery. Agora todo mundo parou de procurar a gente. Só querem saber daqueles suínos infelizes.
Pelo menos estou livre de pegar gripe dessa vez. Mudou o animal, mudou o tipo de vírus. Já foi duro ter ficado com gripe aviária e ter ficado de m**** no poleiro. Mas por via das dúvidas, já estou andando de máscara. Ter vizinhos que são porcos e ficam espirrando o dia inteiro dá medo.
Mas quer saber de uma coisa? Essa é a primeira e última vez que falo nesse fato. Por mim, todos os porcos deveriam morrer e acabar com essa encheção de saco. O granjeiro podia tomar nossas dores e exterminar essa raça, pelo menos daqui de dentro do sítio. Enquanto isso não acontece, vamos ter que continuar ouvindo gritos histéricos por todo o mundo.
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Vou desativar meu antigo blog, o “Memórias de um frango”. Para isso, vou resgatar as crônicas que estavam postadas lá, dar uma repaginada e trazer para cá. Depois da gripe aviária, foi a vez dos porcos se tornarem alvo da doença. Foi uma histeria coletiva em 2009 e muita gente ainda carrega o hábito de usar o álcool gel nas mãos por causa desse época. O frango, ciumento como ele é, não poderia deixar barato essa falta de protagonismo.
Começou a escrever em 2008 para fugir de uma rotina massante no galinheiro e descobriu que era bom naquilo. Ou pelo menos achava que era, já que nunca conseguiu dar nenhum beijo na boca por seus textos. Dizem por aí que continua virgem, mas ele nega.