Estou passando por umas duas semanas complicadas, em que meus pensamentos não têm me deixado em paz. Achei que era a sensação de caos iminente que conheço e aprendi a conviver há 15 anos, mas, aos poucos, vi que não era. Afinal, sei como funcionam meus ataques de ansiedade e, dessa vez, tá diferente. Sem saber como lidar com isso, fiz o que faço de melhor: me enfiei de cabeça no trabalho e ignorei o resto. Cheguei mais cedo e saí mais tarde da empresa todos os dias. Dei uma ocupação pro meu cérebro, lidei com questões urgentes na empresa e evitei as que estão latentes em mim. Deixei meu cérebro ficar ocupado pra não pensar em mais nada. Nesse caminho, fui me desgastando. Até culminar na tarde deste domingo – em que estou trabalhando, diga-se –, em que me encontro física e mentalmente exausto.

Sim, tá em um momento com um volume muito grande de coisas pra fazer na empresa e isso tem me deixado mais inquieto do que o normal. Tenho pra mim que preciso dar conta das coisas e, quando não dou, fico mal de verdade. Tenho ficado pior ultimamente. Mas não é esse o problema. É uma válvula de escape. Eu sei. Uma forma fácil e momentânea de aliviar o sentimento de estranhamento que tenho vivido há algum tempo. Porque, no fundo, tenho certeza absoluta de que estou estragado.

Antes que venham me xingar, meu lado racional sabe que “estragado” não é a palavra mais adequada. É só uma metáfora que explica bem o que venho sentindo, sei lá, desde a pandemia. Há algum tempo sei que algo está fora do lugar. Vem do período de isolamento e foi agravado com a morte da minha mãe. Isso tá bem evidente pra mim. É uma sensação de que estou vivendo de um jeito errado. De que não é possível ser só isso. Meu movimento consciente de me cuidar mais tem a ver com isso. Há alguns meses tenho tentado olhar mais pra mim. Tenho me cuidado, melhorado a alimentação, ido à academia com frequência e tentado maneirar em alguns vícios – alguns com mais sucesso do que outros. São pequenos passinhos, necessários. Mas então vem meu lado irracional e, do fundo do inconsciente, joga tudo isso por terra.

Meu lado irracional insiste em gritar que sou um bosta. Diz o tempo todo que não há motivos plausíveis pra não dar conta de cumprir todas as obrigações que me passam. Que outras pessoas conseguem e eu deveria conseguir também. Que não tem porque deixar os cuidados com a casa de lado. Que deveria dar um rumo na vida e parar de choramingar sem motivo. Que estou me fazendo de coitadinho e querendo que as pessoas tenham dó de mim. Que deveria estar conseguindo fazer todas as aulas da pós com o esmero que elas merecem. Que estou incomodando meus amigos com problemas que só existem na minha cabeça e daqui a pouco ninguém mais vai querer falar comigo. Que não conquistei nada até agora e nunca vou conquistar nada. Que estou sendo inconveniente e deveria ficar quieto pra sempre. Que não me dedico o suficiente em todas as coisas. Que mereço estar sozinho porque não sou interessante o suficiente. Que ninguém nunca mais vai falar que está a fim de mim e, se falar, com certeza estará doida. Que ficar mais de ano sem qualquer possibilidade de sexo é o que mereço por ser feio e detestável. Que sou o problema e responsável por tudo.

E, em todas as vezes, o lado irracional vence. Mesmo não tendo razão.

Outro dia, voltando de um rolê com um amigo que me conhece há quase 20 anos, ele afirmou que não tinha motivo nenhum pra me sentir assim. Listou inúmeras qualidades. Falou coisas bonitas. Eu sabia que ele estava falando a verdade. Mas meu lado irracional não acreditou. Porque não é possível essa pessoa que ele descreveu estar com a cabeça tão fudida igual a minha. Porque a cada vez que recebo uma mensagem no sábado de manhã cobrando coisa de trabalho que não deu tempo de fazer, me sinto um bosta incapaz. Ou porque depois de passar uma semana em um app de relacionamento e não ter nenhum tipo de retorno, não tem como eu acreditar que qualquer moça vá se atrair por mim. E porque é impossível eu não me comparar com situações vividas pelos meus próprios amigos e pensar que, caralho, o que tô fazendo de errado que essas coisas não acontecem comigo também?

É uma visão errada pra caralho de mim mesmo. Eu sei. Inclusive, tá todo mundo vivendo seu próprio mundinho interno e questionamentos que, pra mim, já podem ter sido superados. Mas é aquilo, o irracional vence e me derruba. Todas as vezes é isso.

Por isso tenho certeza de que minha cabeça tá estragada e ainda não tenho as ferramentas necessárias pra consertá-la. Tem quase sete anos que busco na terapia onde estão essas rachaduras na minha mente e acabei abrindo elas ainda mais. Fiquei mais consciente das minhas limitações e sei o que preciso destravar dentro de mim mesmo. Mas de nada isso adianta se não sei como fazer isso na prática. Cheguei a um ponto que, pasmem, a terapia está fazendo mais mal do que bem e vou precisar dar uma pausa pra colocar a cabeça no lugar longe do divã.

Esse texto é mais um grito. É parte do processo de me entender e colocar pra fora sentimentos que não consigo externar com facilidade. Até mesmo porque meu lado racional sabe que é importante falar, mas o irracional diz que é uma bobeira e ninguém se importa. Não sou importante o suficiente pra ninguém se preocupar com meus problemas e preciso me resolver sozinho. É ridículo, sei. É o id brigando com o super ego na minha frente e não consigo fazer nada pra interromper o rabo que se formou no meu cérebro.

Ou seja, não tem uma conclusão bonita aqui. Tem uma pessoa em plena confusão que está achando cada vez mais difícil cumprir a única meta que colocou para a vida: ser sempre a melhor versão de si mesma. Não sabia que isso seria tão difícil…