Por favor, cuide da mamãe
Kyung-Sook Shin
Publicado em 2008
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De todos os sentimentos, o que mais me aflige é a impotência. É me sentir de mãos atadas diante de determinada situação e não poder fazer nada para reverter algo que me incomoda. É aquela hora que dá vontade de sentar e chorar, não por fraqueza, mas por impossibilidade de agir. Se você já sentiu isso, com certeza sabe do que estou falando e sabe o quão ruim é.
Por favor, cuide da mamãe trata especificamente desse tema, trabalhado na figura de um desaparecimento. Tudo começa quando Park-So-nyo, uma mulher de 69 anos e mãe de cinco filhos adultos, some no metrô de Seul. O marido, que sempre andava na frente da esposa, só deu falta dela quando já estava dentro do vagão, tarde demais para qualquer ação. É então que começam as buscas pela mãe/esposa e as feridas de relacionamentos desgastados começam a se abrir.
Sempre achei que morrer é melhor do que desaparecer. Quando não há confirmação de nada, a esperança ainda existe. E isso desgasta. Não há como sofrer, superar e seguir em frente. Tudo para no sofrer. A vida passa a ser uma grande incerteza. A pessoa está viva? Perdeu a memória? Morreu? É impossível saber e essa impotência é terrível.
Quando Park-So-nyo desaparece, os filhos e o marido começam a reviver todos os momentos que passaram com ela e percebem que foram deixando-a de lado com o passar dos anos. Em certa altura, um dos personagens comenta: “Acho que todos se esqueceram de mamãe. Ninguém tem telefonado”. Eles se esqueceram que por trás da figura que conheciam ainda havia uma mulher com sonhos e desejos, que se preocupava com os outros e tinha uma vida fora da casa. É aquela velha história de que só darmos valor para algo quando perdemos.
A estrutura do livro contribui muito para essa sensação, pois cada capítulo se passa no ponto de vista de um personagem. Sabemos a motivação de muitos deles, como foi a relação com a mãe/esposa, o que eles deixaram de dizer e o que se arrependem de não terem dito. Mas o grande trunfo está no capítulo final, que tem a própria Park-So-nyo como personagem principal e revela aquele sentimento de perda impregnado ao longo da trama.
Mas uma coisa que me causou muito estranhamento foi a narração do livro. Apesar de ser feita em terceira pessoa, o personagem central de cada capítulo é o próprio leitor. O narrador conversa com a gente, como se fossemos o personagem em destaque. É difícil explicar, então veja esse trecho (logo no primeiro parágrafo do livro) que exemplifica isso: “Reunida na casa do seu irmão mais velho, Hyong-chol, a família troca ideias. Você decide preparar panfletos e distribuí-los onde mamãe foi vista pela última vez”. Entendeu?
Ainda que essa forma de narrar permeie todo o livro, dando tempo para nos acostumarmos com ela, hora nenhuma o estranhamento passa. Por muitas vezes me peguei lendo um trecho mais de uma vez por isso. Só em um único capítulo que esse padrão não se repete, e ele é uma brisa feliz no meio da narrativa. Nunca tinha visto nenhum livro que utilizasse esse recurso e, depois de ler Por favor, cuide da mamãe, entendi porque não.
Apesar disso, Por favor, cuide da mamãe é um livro bonito. Encantador e, ao mesmo tempo, triste. Ao final da leitura, a vontade é correr, abraçar sua mãe e dizer que a ama. Eu pelo menos fiz isso.
Por favor, cuide da mamãe (do original, Ŏmma rŭl Put’akhae)
Kyung-Sook Shin
Editora Intrínseca, 2011 (lançado em 2008)
236 páginas
Tradução: Flávia Rössler
ISBN: 978-85-8057-132-5
Comecei a vida dentro de um laboratório de química, mas não encontrei muitas palavras dentro dos béqueres e erlenmeyers. Fui para o jornalismo em busca de histórias para contar. Elas surgem a cada dia, mas ainda não são minhas. Espero que um dia sejam.