O saci
Monteiro Lobato
Publicado em 1921
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“– Pois, seu Pedrinho, saci é uma coisa que eu juro que “exeste”. Gente da cidade não acredita – mas “exeste”. A primeira vez que eu vi saci eu tinha assim a sua idade.”
Em 1918, Monteiro Lobato publicou um livro que seria o grande tratado sobre o mais conhecido personagem do folclore brasileiro. Foi em O Saci-Pererê: Resultado de um inquérito que o autor apresentou o mito, as variações e as histórias de pessoas que disseram tê-lo visto. Importante por unificar a figura do menino negro de uma perna só, essa não foi a única vez que o autor o utilizou em seus livros.
Três anos depois, em 1921, o personagem desembarcava em uma terra mágica chamada Sítio do Picapau Amarelo. O livro em questão é O Saci, que traz uma história curta centrada no Pedrinho e em sua obsessão por capturar um saci. Para fazer isso, ele precisa se aconselhar com Tio Barnabé, que conta que os sacis realmente existem e que há uma forma de prendê-los dentro de garrafas. Pedrinho, então, sai para a caçada, consegue capturar um e eles fazem amizade. Os dois, então, passam a noite no capoeirão, explorando todos os segredos da mata fechada.
“– O saci – começou ele – é um diabinho de uma perna só que anda solto pelo mundo, armando reinações de toda sorte e atropelando quanta criatura existe. Traz sempre na boa um pitinho aceso, e na cabeça uma carapuça vermelha.”
Como disse na resenha de Reinações de Narizinho, um dos pontos fortes da obra lobatiana é a reunião de contos de diversos lugares e a forma como ele os coloca dentro do Sítio. Em O Saci, em vez de utilizar histórias de outros lugares, Lobato mergulha dentro do nosso próprio folclore. É nesse livro que descobrimos como nascem os sacis, aprendemos sobre mula sem cabeça, lobisomem, boitatá, Negrinho do Pastoreio e Cuca, além de nos apaixonarmos pela Iara. É uma excelente forma de conhecermos um pouco mais de nossa própria cultura, às vezes muito negligenciada.
O único porém é que o livro é explicativo demais. Ao fazer um tratado completo sobre os animais da mata e sobre os seres sobrenaturais, Lobato se limita a descrever cada um deles e o que fazem. Para isso, o autor abusa dos diálogos entre Pedrinho e o Saci, pontuado por perguntas e respostas detalhadas. A aventura, que seria o forte do livro, acaba deixada em segundo plano.
“– Mas que reinações ele faz? – indagou o menino.
– Quantas pode – respondeu o negro. – Azeda o leite, quebra a ponta das agulhas, esconde as tesourinhas de unha, embaraça os novelos de linha, faz o dedal das costureiras cair no buraco, bota mosca na sopa, queima o feijão que está no fogo, gora os ovos das ninhadas. (…) O saci não faz maldade grande, mas não há maldade pequenina que não faça.”
Esse cenário só muda no final do livro. Quando Saci e Pedrinho voltam para o Sítio, descobrem que a Cuca, “a rainha das coisas feias”, transformou Narizinho em pedra com um feitiço. Aí sim a aventura engrena, mas é uma pena que dura tão pouco e logo o livro acaba. A batalha entre os dois e a Cuca é divertida e traz à tona as características mais marcantes de Pedrinho. O final é poético, com um paralelo interessante entre a forma como Narizinho foi enfeitiçada e como o Saci se despede.
Pequena confissão
Apesar de ser muito fã da Emília, o personagem do Sítio que mais gosto é o Pedrinho. Quando eu era criança, queria ser ele. Queria ter um estilingue, sair pelas matas e ser aquele moleque do seriado que não tinha medo de nada (a não ser de vespas). Queria ter histórias de aventuras para contar, mas nada acontecia de tão emocionante nas capoeiras que eu desbravava no sítio do meu pai.
Há algumas semanas, meu sobrinho apresentou uma dança na escola, vestido de Pedrinho. Meu pai arrumou um estilingue pra ele, de metal, todo bonitão. Lógico que me apoderei do brinquedo e passei a tarde inteira brincando de atirar em latas. Eu me sentia mais Pedrinho a cada estilingada que dava. Recomendo uma sessão dessa por mês para todo mundo!
O Saci
Monteiro Lobato
Editora Globo, 2007
71 páginas
ISBN 978-85-250-5045-8
P.S.: Todas as imagens do post (com exceção da placa) são da intervenção Saci Urbano, do artista Thiago Vaz. Para ver mais imagens e saber mais sobre o projeto, clique aqui.
Comecei a vida dentro de um laboratório de química, mas não encontrei muitas palavras dentro dos béqueres e erlenmeyers. Fui para o jornalismo em busca de histórias para contar. Elas surgem a cada dia, mas ainda não são minhas. Espero que um dia sejam.