Memórias de uma gueixa

Arthur Golden
Publicado originalmente em 1997

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Você vai a uma festa e avista uma moça misteriosa e encantadora. Trocam olhares, flertam um pouco e, depois de um bom tempo, começam a conversar. O papo flui e vocês veem que podem se dar muito bem juntos. Já encantados, se entregam e vivem o momento. Você a leva para seu apartamento, rola aquele clima e enfim começam a transar. Mas então, na hora de gozar, ela solta um comentário idiota que te faz brochar. Essa foi minha relação com Memórias de uma Gueixa, de Arthur Golden.

O livro conta a história de Niita Sayuri, uma das mais populares gueixas do Japão nas décadas de 30 e 40. Para quem não sabe o que é uma gueixa e está com preguiça de procurar no Google, elas são as mulheres que estudam e praticam a arte da sedução, participando de aulas e entretendo festas. Isso não significa que elas sejam prostitutas. Muito pelo contrário.

Voltando ao livro, tudo começa quando Sayuri ainda era criança e se chamava Chiyo Sakamoto. Vivendo com os pais e a irmã Satsu, a menina vê sua mãe à beira da morte e é vendida por seu pai. Enquanto Satsu é entregue para ser prostituta em Gion, Chiyo é levada para um okiya, uma espécie de casa que abriga gueixas e cuida de seus compromissos/finanças.

É a partir de então que o livro se torna encantador. A história da pequena Chiyo para se tornar uma gueixa é contada de maneira simples e bonita, mostrando as adversidades, os problemas enfrentados no começo dos treinamentos, as primeiras festas e os primeiros suspiros masculinos.

Mas o que dá graça ao livro são os personagens. Chiyo/Sayuri passa a pureza e a inocência de uma criança que sofreu muitas perdas e está descobrindo um mundo novo. Hatsumono é unica gueixa do okiya onde mora Sayuri, uma das mais belas do Japão e que faz de tudo para destruir a iminente carreira de Sayuri. Abóbora é a outra gueixa em treinamento que mora no okiya, mas é desastrada e não tão bonita quanto as outras duas.

Porém o personagem mais fascinante para mim é Mameha, a gueixa que vira irmã mais velha de Sayuri e passa a ensiná-las várias técnicas e a introduz no mundo do entretenimento masculino (novamente não estou falando de prostituição). Mameha é quem vai desenhar o futuro da jovem gueixa e fazer com que ela se torne uma das maiores do Japão, assim como Mameha também fora.

Eu só falei das mulheres até agora porque precisava deixar os personagens masculinos para este momento. Todo o trabalho de uma gueixa é para conquistar um homem. Pelo menos é essa a impressão que o livro passa. Aquelas que não possuem um danna (um cara que a sustente, um “dono”), são menos bem sucedidas do que as que têm. Toda a maquiagem, toda a dança, o trabalho com chá e entretenimento é para, no fundo, conquistar um homem.

No meio de todas as fantasias de Sayuri, dois homens merecem destaque, principalmente pela construção dos personagens. Um deles é o benfeitor de Sayuri e o outro é o seu grande amor. O primeiro se chama Nobu Toshikazu, um sujeito que participou da guerra e carrega profundas cicatrizes dessa experiência (inclusive a perda de um braço), sendo chamado pela maioria das pessoas de “lagarto” pela aparência de seu rosto. O segundo é o Presidente, um cara que encontrou com Sayuri antes mesmo dela ser aprendiz de gueixa e por quem, desde então, ela é apaixonada.

Os dois homens são donos da Eletrônica Iwamura e frequentemente convidavam Sayuri e Mameha para entreter as festas da empresa. É lógico que não vou contar o que acontece com cada um dos dois personagens, mas a obsessão de Sayuri pelo Presidente chega a ser insuportável.

Todo mundo que me conhece sabe que sou tão sensível quanto uma porta. Foi por isso (e pela falta de habilidade de escrita) que detestei toda a “saga” Crepúsculo. Na hora que o Memórias de uma Gueixa começou a ir para esse caminho, vi que todo o encanto que eu tinha construído havia desmoronado. Lembram do começo da crítica? Foi nessa hora que broxei.

[SPOILER]
O livro termina com o Presidente se declarando para Sayuri, falando que todo o treinamento que ela recebeu foi por causa de um pedido dele, que ele tinha se afastado dela todos esses anos por conta do interesse de seu amigo Nobu nela e tchururu.
[/SPOILER]

Uma melação só. Se o livro fosse seguir o tom do início durante toda a narrativa, o final seria bem diferente. Mas não foi. E essa mudança no tom da história foi o que mais me incomodou. Temos 400 páginas que dizem uma coisa e 50 que tentam desconstruir as figuras que conhecemos e aprendemos a gostar.

P.S.: Sim, ele já virou um filme que ainda não assisti, mas todas as imagens deste post são dele.

Memórias de uma gueixa (Memoirs of a geisha)
Arthur Golden
Imago, 2006 (originalmente em 1997)
460 páginas