Despertou em meio a uma floresta com vegetação cerrada, árvores altas e clima sombrio. Ainda com o corpo meio atordoado, não conseguiu se localizar. Mexeu as mãos, os pés. Conseguiu andar um pouco. Tudo em ordem. Havia neblina por todos os lados. Nem os animais faziam barulho naquele silêncio profundo. Alguma coisa importante aconteceria em breve. Ela quase podia tocar a tensão espalhada pelo ar.
Foi quando sentiu uma mão em seu ombro, tocando-a de leve. Assustada, seu primeiro impulso foi gritar. Como se previsse a atitude da menina, a magnífica criatura loira tampou sua boca com a mão e fez um gesto para que ela se acalmasse. Quando olhou para os olhos verdes, as orelhas pontudas e para o rosto alongado e sério, se lembrou imediatamente de quem era aquele elfo: Amras.
– A batalha está quase começando. Suba nessa árvore que você estará protegida. É um bom lugar para acompanhar de perto nossa ação, sem se machucar.
Ela subiu e ficou quietinha, ouvindo os pequenos barulhos que o exército de elfos fazia. Agora conseguia percebê-los com clareza, escondidos nas árvores, pendurados em galhos. Arcos, flechas e espadas nas mãos. Camuflados. Aqueles pequenos movimentos que antecedem uma batalha terrível.
E enfim se lembrou de toda a preparação para o ataque, planejado a exaustão nas últimas noites. Ainda não sabia quem era o inimigo, mas tinha certeza de que ele estava por perto. Ouviu, então, um grito ao longe, seguido por um discurso inflamado. Não conseguiu entender, pois estava em um idioma que ela não conhecia. “Os orcs estão por perto. Preparem-se”, ouviu um dos elfos sussurrar. Do outro lado, gritos e batidas de tambores acompanharam o fim do falatório. O som era ensurdecedor/assustador.
A marcha avançou pela floresta e os elfos permaneceram escondidos, com as armas preparadas. Então três orcs apareceram, andando com cautela. “Batedores, sem dúvida”, pensou a menina. Eles avançaram, viram a trilha livre e recuaram. Aos poucos o exército orc apareceu e ocupou todo o caminho. Maças, espadas, porretes, tochas, escudos, lanças. Armas dos mais diversos tipos.
Nem tiveram a chance de usá-las direito. Quando o pelotão estava embaixo da árvore da menina, Amras gritou para todos os elfos: “Atacar! Por Fëanor! Avante elfos!”. Flechas voaram por todos os lados. Orcs caíram sem saber o que os havia atingido. O sangue escorria por entre as árvores, manchando o solo imaculado daquela área. Poucos sobreviveram ao ataque surpresa, mas organizaram um contra-ataque com eficiência.
Investindo contra os elfos, a linha de orcs sobrevivente conseguiu derrubar sete inimigos de uma única vez. Desgarrando-se do bando, o líder, uma criatura grande, de couro espesso e cara de poucos amigos, avançou na direção de Amras com a espada a postos. Avançava com uma velocidade que seria impossível de se desvencilhar do golpe. Quando a espada chegou perto do pescoço do elfo, a menina prendeu a respiração e tampou os olhos com as mãos. Estava sentindo muito medo do que aconteceria com o seu amigo.
Na mesma hora sentiu um cutucão na altura do ombro. Quando abriu os olhos, viu-se sentada no ônibus, chorando, com um livro no colo. A seu lado, uma senhora, com um olhar preocupado, perguntava o que havia acontecido, se ela estava bem.
– Foi só o livro, senhora. Só o livro – e enfim conseguiu respirar aliviada.
Comecei a vida dentro de um laboratório de química, mas não encontrei muitas palavras dentro dos béqueres e erlenmeyers. Fui para o jornalismo em busca de histórias para contar. Elas surgem a cada dia, mas ainda não são minhas. Espero que um dia sejam.