Acordou cinco minutos antes do despertador. Era uma segunda-feira nublada e preguiçosa, mas nem precisou acionar a função soneca como fazia todos os dias. Nos primeiros acordes da música já estava em pé, ainda pilhado por causa do projeto novo. Havia passado o final de semana inteira terminando de planejar as ações e agora estava tudo pronto. Uma cópia em seu e-mail, outra no e-mail do chefe, uma salva na nuvem e uma cópia reserva no pen drive, para o caso de tudo dar errado. Estava mais do que preparado para a apresentação que mudaria o rumo de sua vida.
Como ficou pronto cedo, resolveu deixar o carro na garagem e ir para o escritório caminhando. Em meia hora estaria lá, isso se andasse com calma. Era tempo de sobra para repassar todos os tópicos que ensaiara à exaustão no dia anterior. Análise de custos? Ok. Ações de marketing? Ok. Impacto na empresa, mapeamento de riscos, pessoal disponível. Ok, ok e ok. Não tinha como dar errado.
Nas ruas, as pessoas iam devagar, um carro na esquina vinha devagar, o cachorro ia devagar e, se tivesse um burro por ali, com certeza ele também iria devagar. Todos no ritmo do frio que embalava a cidade, com suas blusas de frio e carrancas de segunda-feira. Ele, ao contrário, ostentava um sorriso no rosto e distribuía bom dias para todos que passavam. Pela reação, ninguém estava preparado para uma dose de bom humor matinal.
Não que ele se importasse. Seguia com seu sorriso e seus passos decididos rumo ao trabalho. Foi quando aquele carro que vinha devagar se emparelhou com ele e parou. Armou a expressão mais simpática que conhecia para responder ao sujeito lá dentro, mas em troca recebeu três tiros no rosto, um no coração e outro no pulmão esquerdo. Caiu ali mesmo, com as quatro cópias do trabalho salvas em diferentes lugares e uma poça de sangue rodeando seu corpo.
Comecei a vida dentro de um laboratório de química, mas não encontrei muitas palavras dentro dos béqueres e erlenmeyers. Fui para o jornalismo em busca de histórias para contar. Elas surgem a cada dia, mas ainda não são minhas. Espero que um dia sejam.