I don’t pretend to know
The challenges we’re facing
I know there’s no replacing what we’ve lost
And you need time
It’s quiet uptown – Hamilton
Ano passado não teve o tradicional texto de redenção porque, diante de tudo que aconteceu, não havia clima para comemorar. Nada que tivesse se passado nos meses anteriores diminuiria a dor que começou no final de outubro e que persiste até hoje. Mas este ano sinto que é diferente. Ainda não consigo acreditar que fazer uma crônica de redenção é algo justo diante do que vivi, mas tenho certeza de que preciso escrevê-la. Por mim. Para colocar a cabeça no lugar. Mostrar para mim mesmo que, sim, há coisas boas ao meu redor e que me fazem permanecer de pé e lutando.
Quando minha mãe morreu, prometi para meus sobrinhos que cuidaria deles como ela tinha cuidado a vida inteira. Os cinco são as pessoas que mais amo nesse mundo e, se algo de bom fica de 2023, é que esse amor só cresceu. Morando sozinho na casa que era da minha mãe, fico feliz quando eles estão por perto. A casa fica cheia de vida de novo e meu coração volta a bater no ritmo certo. Mesmo quando estou trabalhando e eles estão no outro cômodo, fazendo outras coisas, fico tranquilo de ter eles comigo. Tenho tentado ser o melhor tio que consigo ser e, mais do que nunca, descobri que essa é a minha melhor faceta. Para alguém que tem como meta constante de fim de ano “ser a melhor versão de mim mesmo”, eles me mostram que eu posso ser essa pessoa.
Meus amigos também me mostram isso todos os dias. Nas semanas que se seguiram à morte da minha mãe, recebi tanto carinho que confirmei uma coisa que eu já sabia: tenho os melhores amigos do mundo. E eles vão para além de uma mão. Porra, eles vão para além das mãos dos pés e das mãos somadas. Sou muito sortudo por isso. Em uma sociedade em que muitos reclamam de que não conseguem se conectar com os outros, tenho tido muita sorte de poder contar com pessoas especiais ao longo de toda a minha jornada. Foi um ano de comemorar conquistas e casamentos, apertar novos bebês, lamentar questões pessoais e separações, mas, principalmente, de poder estar ao lado num fim de tarde sem fazer nada. Posso estar parecendo um disco arranhado, mas realmente sou um sujeito de sorte por ter tanta gente boa ao meu redor e só quero conseguir retribuir isso.
E, por mais que eu tenha chegado ao fim do ano esgotado, acho que o balanço final é positivo. Em meio ao caos que foi lidar com a ausência da minha mãe e com os pequenos problemas diários, que me fizeram afundar de cabeça no trabalho para distrair a mente, chego em dezembro com esperança de que dá para mudar esse cenário. Como disse na crônica do exorcismo, preciso focar um pouco mais em mim mesmo, nas coisas que gosto para sair da apatia que me consumiu. Escrever esse texto de redenção tem muito a ver com isso, inclusive. É um passo para sair da inércia que está a vida e me forçar a andar com meus próprios passos. Estou cansado da sensação de ser levado. Quero tentar fazer algo por mim mesmo e essa retrospectiva me ajudou a refletir bastante sobre isso.
A sensação é de que 2024 vai ser melhor. Não prometo um ano incrível porque ainda há muito a ser feito internamente antes de começar a me sentir pleno de novo, mas posso dizer que vou tentar. Há alguns planos desenhados, outros que estão latentes, e uma vontade constante de sair correndo para liberar a energia acumulada. É só centralizar ela para o lugar certo que as coisas podem se acertar. Ou pelo menos quero acreditar que elas podem se acertar.
*Como no exorcismo, não vou revisar ou editar este texto. O objetivo é ser um desabafo, não uma aula de literatura ou gramatical.
Comecei a vida dentro de um laboratório de química, mas não encontrei muitas palavras dentro dos béqueres e erlenmeyers. Fui para o jornalismo em busca de histórias para contar. Elas surgem a cada dia, mas ainda não são minhas. Espero que um dia sejam.