Foto: Pedro Souza | Atlético

“Que mistério tem o Atlético que, às vezes, parece que ele é gente?”, nos perguntou Roberto Drummond em uma de suas mais famosas crônicas dedicas ao Galo. Não sei te responder, meu mestre, mas quando o título veio, pensei em você.

Pensei nas suas crônicas, que embalaram momentos muito especiais da minha vida. Nas pessoas que dividiram comigo essa paixão pelo Galo ao longo dos meus 32 anos. Na primeira vez que fui levado ao estádio e me encantei pela torcida. Nos amigos que fiz e que partilharam as dores e os sofrimentos nos momentos mais difíceis. Naquele rebaixamento doído em 2005, que só fez aumentar nossa paixão. Nas vezes em que batemos na trave. Que paramos na chuva. Em uma expulsão injusta ou um pênalti não dado. Naquele título improvável de 2013. No êxtase de 2014 em cima do nosso maior rival. No sonho que julgávamos impossível de, enfim, conquistar o Brasileirão mais uma vez.

Então me lembrei que você não está mais aqui para vivenciar esse momento e nos presentear com uma crônica magistral sobre nossa maior conquista. Por isso, não quis escrever este texto – que me recuso a chamar de crônica esportiva, em respeito a você – no calor do momento, com medo de que as palavras saíssem trêmulas quando colocadas na tela do computador. Não faria jus a qualquer coisa que você poderia ter escrito e eu queria lhe fazer uma justa homenagem. Dessa forma, esperei um dia para ver se era possível entender a magnitude do feito. Não adiantou, então peço desculpas.

Duvido que algum dia eu – ou qualquer outro atleticano – consiga absorver o que aconteceu na noite de 2 de dezembro de 2021 em sua plenitude. Uma catarse coletiva da nação alvinegra. Uma data que ficará marcada para sempre na história do Galo e na minha história. Ainda está difícil de acreditar. E, olha, é uma descrença descabida, ainda mais para a torcida que gritou “Eu acredito” em viradas impossíveis. Mas, enfim, está escrito. Posso te dizer com orgulho, mestre, o Clube Atlético Mineiro é o campeão do Brasileirão 2021.

E tinha que vir com emoção, após sair perdendo o jogo contra o Bahia por dois a zero. O mesmo placar que nos perseguiu na semi e na final da Libertadores de 2013. O das viradas impossíveis das quartas e da semi da Copa do Brasil de 2014. O atleticano, forjado na luta e no sofrimento, precisou acreditar em uma nova virada impossível. Ela foi construída em apenas cinco minutos. Cinco minutos, sabe. Da marcação do pênalti no Sasha até a última pintura anotada pelo Keno, Belo Horizonte foi da desesperança à insanidade. Não cancela o trio elétrico que estava nos esperando, o Galo deu um jeito de garantir a festa.

Vou te falar uma coisa, mestre. Por mim, este seria o último Campeonato Brasileiro. Ano que vem inventa um torneio novo, nos mesmos moldes, mas com um nome diferente. É muito simbólico que o primeiro campeão seja o último, 50 anos depois. Esperamos essa glória por muito tempo. Agora podem empilhar troféus na sede, mas nenhum será melhor do que esse. Para gerações e gerações, foi o primeiro. Tem o gosto e a tensão do primeiro amor. Daquele beijo tão aguardado, da primeira transa com a pessoa amada. Da primeira viagem sozinho para explorar o mundo. Um gosto de liberdade e paixão que poucas vezes sentimos na vida.

Você tinha razão, mestre. Mais do que nunca a bandeira do Galo tem o cheiro da mulher ou do homem amado. Ela cheira a lágrimas, a gritos de gol, a dor e, principalmente, a festa e alegria. Você devia estar aqui para ver essa mesma bandeira cobrindo o pirulito da Praça Sete, com a torcida insandecida ao redor do maior símbolo de Belo Horizonte. Tenho certeza de que escreveria sobre como essa paixão transcede o mundano. De que é algo que vem do além. Que faz parte de quem somos. Ser atleticano é parte da nossa identidade. Somos, antes de tudo, Galo.

Este título é para você, Drummond. É para Reinaldos, Éderes Aleixo, Marques, Tardellis e tantos outros que tentaram nos dar essa glória e não conseguiram. É, sobretudo, para cada atleticano, que nunca deixou de torcer contra o vento. A imortalizada camisa 12 merecia uma homenagem a essa altura. No próximo jogo, o Mineirão estará em festa. Eu estarei lá e vou te carregar comigo para ver de perto. Como tantos outros atleticanos levarão aqueles que já se foram para celebrar esse momento. É a homenagem merecida com quem nos fez atleticano. E mesmo que ainda esteja difícil de acreditar, mestre, enfim podemos encher a boca para gritar…

O GALO É BICAMPEÃO BRASILEIRO!