Quando o despertador tocou pela segunda vez, o primeiro pensamento que veio em sua mente foi a bomba que o esperava no escritório. Decidiu continuar na cama mais cinco minutinhos. Lá fora estava frio e escuro. O edredom, quentinho e protegido. Era uma disputa desleal. Para piorar – como se fosse possível -, pingos de chuva batiam na janela. “Que bela segunda”, pensou. “Se nem o sol acordou ainda, tenho o direito de não levantar”. Era a essa desculpa que ele se agarrou quando virou de lado e dormiu novamente.

Os cinco minutinhos passaram, a soneca virou um sono inteiro e ele acordou depois de meia hora. Atrasado, se arrumou às pressas. Banho, roupa, dentes. Café da manhã? Nem pensar, não tinha tempo. Era dia de auditoria. Tinha que chegar mais cedo para apresentar os resultados semestrais para a diretoria. Não estava nem um pouco empolgado por isso.

A semana anterior foi a do excesso de horas extras, cansaço e preocupação. Passou o fim de semana fechando os relatórios que faltavam. Os números não eram bons, ele sabia. O que não sabia era como melhorá-los. Dormiu mais por exaustão do que por sono. Não teve tempo de encontrar os amigos, falar com a família ou passar um tempo com a namorada. Malditos números.

Agora estava atrasado e debaixo de chuva, esperando um ônibus que teimava em não passar. Cinco, dez, vinte minutos. A barra da calça molhada e encharcando sapatos e meias. O guarda-chuva mais molhava do que defendia da chuva. Nas costas, o peso de um possível corte de funcionários por causa dos maus resultados da equipe. Sentia que estava carregando o mundo. Era demais para uma manhã de segunda.

Quando chegou ao escritório, teve tempo apenas de pegar o pen drive e correr para a sala de reunião. Alguns coordenadores de outras áreas, poucos diretores. O resto estava atrasado. “Vão culpar a chuva”, pensou, “Peguei a mesma chuva que eles e nem atrasei tanto”. Mas abriu um sorriso e cumprimentou um por um. Apertos de mãos e afabilidades. Sua vontade era pegar cada uma das pilhas de papel que eles carregavam e rasgar em pedacinhos. Jogar tudo pro alto. Bater a porta atrás de si e abandonar aquele lugar que tanto lhe causava preocupações.

Não o fez. Se forçou a abrir um sorriso e continuar. Como fazia todos os dias.