Por que Indiana, João?

Danilo Leonardi
Publicado em 2014
Compre aqui


Dentre os vários canais sobre literatura no YouTube, poucos se destacam tanto quanto o Cabine Literária. Se hoje ele é composto por uma equipe grande, quem segurava o forninho lá no longínquo ano de 2011 era o Danilo. Foi dele, aliás, o primeiro vídeo que assisti sobre literatura no YouTube, ainda no inicinho do canal. Desde então, faço questão de acompanhar as coisas por lá.

Quando ele disse que estava escrevendo um livro, logo fiquei curioso para ver o que sairia. O resultado foi Por que Indiana, João?, que conta a história de João Vitor Galeto, um menino de 15 anos que enfrenta diversos problemas na escola por conta do bullying. Tímido, é importunado por um cara maior, atlético e popular chamado Guilherme. Depois de diversos afogamentos no vaso e brincadeiras com tintas, João decide reagir às agressões e dá um chute no saco do Guilherme. Essa briga vai parar no YouTube e o menino se transforma, de uma hora para outra, em uma celebridade na questão “bullying”. É a partir desse ponto que o livro se desenvolve.

A principal inspiração para essa história é, sem dúvida, o Zangief Kid. Em 2011, o vídeo do menino gordinho que reage a um de seus bullies e dá um ippon fez sucesso. O garoto australiano, chamado Casey Heynes, disse que era importunado desde o sixth grade, se sentia muito solitário e que chegou até a pensar em suicídio. As coisas só mudaram depois do vídeo e da reação positiva das pessoas diante de sua atitude.

Com idades semelhantes, as histórias de João e Casey acabam se misturando. Nos dois casos, a família pouco sabia sobre os abusos que os meninos sofriam na escola. Os dois também não tinham muitos amigos que o ajudassem a superar o problema e eram incomodados há muito tempo. A reação de João, apesar de ser menos explosiva que a de Casey, gerou os mesmos resultados (inclusive a suspensão, dada por uma escola mais conservadora).

Porém o livro do Danilo vai além e relata o que aconteceu após o vídeo estourar na internet. É aí que vem os melhores plots da história. O bullying aqui é abordado por cinco diferentes pontos. Começa com a visão da vítima e de sua impotência quando ninguém pode ajudá-la. Depois temos o personagem principal lidando com sua nova função midiática contra o bullying. O terceiro ponto é o da escola, que procura diversas formas para tentar controlar as coisas. Já a quarta diz respeito às consequências do bullying quando atinge níveis extremos e as vítimas explodem de forma violenta.

Deixei o quinto ponto por último porque ele é interessante de ser abordado. Todo mundo se lembra da pessoa que sofreu o bullying, mas o bullie também tem sua parcela de sofrimento na história. Quem está habituado com o mundo da comunicação sabe o poder destruidor que qualquer veículo de mídia pode exercer na vida de alguém. E em um caso onde há um herói, a imagem daquele que é considerado o vilão sai muito prejudicada. É o caso do Guilherme, mas também é o caso do Richard Gale, que agrediu inicialmente o Casey. Essa visão do conflito traz uma outra camada para o livro do Danilo que normalmente é pouco vista.

Agora, antes de continuar, preciso trazer um depoimento pessoal para essa crítica. Sempre fui o mais baixinho da sala, sempre fui tímido com as mulheres, mas nunca sofri bullying. Tive sorte de me cercar por um ótimo grupo de amigos e conviver em espaços de maior tolerância. Nunca presenciei uma cena de bullying nas escolas que frequentei. Sei que existe, sei que é um assunto muito sério, mas me falta experiência no tema.

Talvez por isso eu não seja a pessoa mais adequada a falar do assunto, pois achei que o João não tinha motivos para sofrer bullying. Além da timidez, ele tinha nenhuma outra característica que o destacasse em uma multidão de alunos. Ele podia muito bem passar por invisível nesse cenário. Como sei que esse é um problema que tenho, comprei a ideia dele sofrer bullying e embarquei de corpo e alma em Por que Indiana, João?.

Até porque este é um livro de leitura muito rápida. Nessa primeira obra, o Danilo conseguiu imprimir um ritmo bem fluido, com características de humor e de linguagem que dialogam diretamente com o público infanto-juvenil. Como tudo é narrado em primeira pessoa pelo João, fica mais fácil de entrar no mundo dele e entender seus pequenos dramas diários e as formas que ele encontra para lidar com isso. Esse ponto é fundamental para embarcar de vez na história.

Apesar disso, alguns detalhes soam desnecessários ou mesmo ficam mal explicados ao longo do livro. Há, por exemplo, um personagem chamado Lucas, que aparece e some sem motivo. A coordenadora pedagógica da escola ter um caso com um dos professores também não faz diferença para a trama. Isso sem falar no clímax da história, que eu entendo o motivo de estar ali e ser daquele jeito, mas que soa dramático demais em uma história que não deu nenhum indício de ser assim (e que não precisava ser).

Outro problema fica por conta das atitudes de alguns personagens, que mudam drasticamente durante a história. Em parte isso pode ser justificado pela adolescência, que é um período conturbado na vida de qualquer pessoa. Mas algumas atitudes soam infantis demais para alunos do segundo ano do ensino médio e algumas viradas de comportamento são tão inesperadas que ficam irreais.

Isso sem falar em algumas características dos personagens que deveriam ser importantes, mas que acabam sendo deixadas de lado. O maior exemplo disso é o João ser um grande fã de cinema (o tal Indiana do título é por conta do Indiana Jones), mas isso não é explorado de fato ao longo da história. São citadas músicas e livros, mas os filmes não são usados.

Esses são pequenos detalhes que o Danilo precisa ficar de olho para o próximo livro, mas que não afetam de forma direta o resultado de Por que Indiana, João?. Ele continua sendo um livro bem divertido e relevante ao falar das diversas facetas do bullying, ideal para os adolescentes que vivem, direta ou indiretamente, este problema.

Por que Indiana, João?
Danilo Leonardi
Giz Editorial, 2014
206 páginas

P.S.: O Danilo já disse que vem pra BH lançar o livro e já quero o meu autografado =]