O substituto

Brenna Yovanoff
Publicado em 2010
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A capa metalizada, os objetos pontiagudos em cima de um carrinho de bebê estilizado, a tipografia meio gótica para o título. Quando ganhei este livro de amigo oculto, imaginei que fosse um baita livro de terror, daqueles que iam me deixar com medo por uma semana. Bastou ler as primeiras páginas para descobrir o quão enganado eu estava.

O substituto conta a história de Mackie, um moleque de 16 anos que, à primeira vista, é normal. Mas só à primeira vista. Tímido, magricela e com poucos amigos, ele na verdade esconde um segredo: é um substituto. Ainda bebê, foi trocado por um ser humano e desde então é criado por uma família que não é a sua, vivendo uma vida que também não é a sua. Quando a terra firme começa a desgastá-lo fisicamente, deixando-o à beira da morte, é que conhecemos sua verdadeira origem e os motivos por trás da troca.

Olhando a sinopse que fiz aí em cima, o livro me pareceu muito mais legal do que ele é. Na real, é um romance adolescente com algumas pinceladas de sobrenatural. É uma obra em que o quase impera em todas as situações. Ele quase assusta, quase tem uma vilã decente, quase tem um bom desfecho, quase tem uma explicação para as coisas que acontecem, quase tem um romance… Quase. No fim, tudo não passa de promessas não cumpridas. Mas vamos com calma para explicar esses pontos.

Logo no primeiro capítulo somos apresentados aos amigos de Mackie e à garota que ele ama, que, no maior clichê dos livros adolescentes, é a garota mais bonita da escola. Mas, por algum motivo desconhecido, ela também se sente um pouco atraída por ele. Também é logo no primeiro capítulo que nos é mostrada, de forma precipitada, a ideia dos substitutos. Tudo sob o ponto de vista de Mackie, já que é ele a narrar a história.

O ponto de ignição vem com a morte da “irmã” de Tate, uma menina com quem o garoto não tinha muito contato (apesar dela ser bem próxima aos gêmeos que são amigos dele), mas que vê nele a solução para seus problemas. É que ela tem certeza que o bebê que morreu na verdade não é sua irmã, que teria sido trocada por uma substituta. Estes casos de troca são comuns na cidade de Gentry e a população sabe do que acontece, mas passou gerações e gerações sem fazer nada a respeito. Eles apenas se calam sobre e seguem vivendo suas vidas.

Aqui vou abrir um parênteses para falar de outra obra que faz isso, mas faz de forma competente. Em A coisa, do Stephen King, a cidade de Derry tem noção de que algo de ruim está acontecendo e se ausenta quando as crianças mais precisam. A explicação, no caso do King, está na figura do Parcimonioso e na forma como ele decide agir. Ele faz parte da cidade, não podendo ser tirado de lá. Já no caso de O substituto, não há um motivo claro para a omissão da cidade. Eles simplesmente fecham os olhos para o sumiço e morte dos filhos e continuam vivendo suas vidas.

E esse é um dos muitos exemplos de “quases” que cercam a história. O foco, na verdade, é a aceitação de Mackie e a forma como ele tenta se encaixar no seu mundo de origem (um mundo subterrâneo, habitado por demônios/deuses e mortos-vivos) e o mundo em que cresceu (a cidade de Gentry). Nesse meio do caminho, várias coisas são trabalhadas apenas em sua superfície, sem mais aprofundamentos.

Aqui vou listar uma série de exemplos de “quases” que não são desenvolvidos e comprometem a narrativa (cuidado porque tem spoilers neste parágrafo inteiro): a mãe de Mackie foi raptada quando criança e levada para o submundo, mas isso quase não tem importância; Mackie simplesmente começa a tocar baixo como um deus quando sobe no palco com outros seres do submundo; não é explicado com clareza se os seres do submundo são demônios ou deuses; a natureza da vilã da história não é revelada; os amigos de Mackie são mal explorados; o romance entre o garoto e Tate é mal trabalhado; A família do melhor amigo do Mackie é a única a não ter membros sequestrados e essa informação não serve para nada. E vários outros exemplos também poderiam ser colocados aqui.

Mas o ponto mais baixo da obra é, sem dúvidas, seu final. Com uma vilã que não convence em momento algum e com uma motivação falha, o desfecho da história é simplório e, mais uma vez, vou abrir um parentes sobre outra obra que faz um final semelhante, mas de forma brilhante. (Alerta de spoilers) Quando o Harry vai atrás do Voldemort na Floresta Proibida, em HP 7, ele aceita a morte de bom grado. O que ele não sabia, aquela altura, é que ele era o senhor da morte e teria o poder de voltar, resultando naquela cena linda entre o garoto e o Dumbledore na estação King’s Cross. Em O substituto, Mackie vem com o mesmo papo: “Que se entrasse de livre espontânea vontade, então a morte não significava morte, mas sim transformação.”. O problema é que aqui não funciona, pois ele enfrenta a grande vilã da história de uma forma simplista, mostrando toda a fragilidade por trás do livro.

Vale lembrar que este é apenas o primeiro livro de Brenna Yovanoff, uma escritora estadunidense que se define como autora de livros jovens-adultos e de ficção especulativa. Há um certo potencial nessa primeira obra que talvez tenha sido melhor explorado nos lançamentos seguintes. Apesar dos problemas, a leitura flui de forma rápida e isso é interessante. Se outro livro dela cair na minha mão, faço questão de dar uma segunda chance para avaliar se os pontos levantados aqui são permanentes no trabalho dela ou não.

Enfim, fica a sensação de que eu deveria ter lido este livro há dez anos e sem a bagagem que tenho de livros sobrenaturais. É apenas um romance adolescente que tenta parecer algo maior usando seres misteriosos. Pena que não consegue.

O substituto (The Replacement)
Brenna Yovanoff
Bertrand Brasil, 2012 (originalmente em 2010)
336 páginas
Tradução: Bruna Hartstein