Acordou com a risada dos amigos na piscina e o cheiro de churrasco invadindo o sítio. Devia ser oito da manhã ou quatro da tarde. Não importava. Depois da décima sexta latinha de Heineken e um possível shot de cachaça, nada mais importava. A dor de cabeça que sentia era só uma lembrança bem-vinda da noite anterior. A merecida comemoração depois de um ano tão bosta.

Quando combinaram de passar o Ano-Novo juntos, a pandemia parecia algo distante. Promessas feitas em meio ao corote, ao glitter e a fantasias, que decidiram levar a cabo mesmo com o aumento dos casos no país. Antes do mundo explodir, tinham o costume de se encontrar em um bar a cada 15 dias. Desde março não faziam mais isso. E também não se viram direito, pelo menos não os cinco ao mesmo tempo. O que não podiam prever é que dezembro chegaria sem previsão para o retorno das resenhas. Mas era hora da virada. E nem mesmo a Covid-19 atrapalharia isso.

Eram amigos há mais de 15 anos. Conheceu o Tuca primeiro, naquelas dinâmicas de apresentação, típica de início de ano na escola. Passaram o recreio trocando ideia e não se desgrudaram mais. O Marco e o Pipoca entraram no grupo pouco tempo depois, quando montaram o primeiro time de futsal da sala. O Tripa foi o último, mas ninguém tem uma lembrança muito clara de quando começou a andar com eles. Mal notaram, ele já estava lá no meio.

Afinal, há coisas que não se pode fazer junto sem acabar gostando um do outro. Não derrubaram um trasgo montanhês, mas sabiam disso. Acompanharam cada um perder o BV (o Pipoca foi o útimo, daí o apelido), se apaixonar, quebrar a cara e se apaixonar de novo (o Pipoca era o mestre). Estiveram juntos nas provas e eventuais recuperações (o Marco, sempre ele). No primeiro porre (os cinco ao mesmo tempo, na casa do Tripa), nas aulas matadas e nas tardes que passavam juntos, sem fazer nada. Baladas, funerais, Carnavais, faculdade e vida adulta. Eram uma constante na vida um do outro.

Inclusive se orgulhavam de ter uma amizade sem muitas reviravoltas. Foram poucas brigas, todas resolvidas rapidamente. Sabiam de muitas histórias de amigos da época da escola que nunca mais se falaram depois da formatura. Sabiam que com eles não seria assim. Por mais que a vida tivesse afastado um ou outro por um tempo, sabiam que hora ou outra ele voltaria. Aliás, sabiam que ele estava a uma mensagem de distância. Que era só ligar que daria um jeito de estarem juntos o mais breve possível.

Durante a pandemia, isso foi ainda mais importante. Com todo mundo preso em casa, um foi o porto seguro do outro. Nos momentos de maior desespero, em que alguém perdia as esperanças, era só mandar uma mensagem no grupo. Nos dias em que batia de vez, podiam contar com pelo menos um deles para um encontro presencial, uma partidinha de Fifa e umas cervejas para aliviar a semana. Tinham certeza que aquilo ali era para a vida inteira.

Por isso não podiam deixar de se encontrar naquele sítio. Era uma forma de celebrar terem chegado ao fim do ano. E pelo jeito todo mundo já tinha levantado. A voz do Tuca ecoava na cozinha, tinha que dar um jeito de sair da cama também. Era o feriado deles, afinal. Ainda grogue, chegou até o amigo.

– Acordou, Delinquente? Pega esse copo aqui porque a carne tá na grelha e é seu dia de lavar as vasilhas.

Deu o primeiro gole de cerveja do dia e abriu um sorriso.