Um dia
David Nichols
Publicado em 2009
Compre aqui
Ganhei Um dia em um amigo oculto, com a justificativa de que “dos livros que você deu opção, esse era o que provavelmente você não compraria por conta própria”. O comentário mostra que a pessoa que me deu o presente realmente me conhece (valeu Dani Boy, minha eterna dupla), pois é um livro romântico, coisa que não costumo ler normalmente.
Antes de comentar sobre a obra, melhor falar sobre a história. Um dia acompanha 20 anos da vida de Emma Morley e Dexter Mayhew. Os dois estudaram juntos, mas só se conheceram de fato na noite da formatura. E quando digo “se conheceram de fato” significa “fizeram sexo”. A partir de então, os 20 anos são narrados um por um, sempre no dia 15 de julho (a.k.a. o dia em que eles dormiram juntos).
Admito que fui fisgado no primeiro diálogo. Os dois deitados na cama, curtindo um pós-sexo e discutindo sobre o futuro. Uma conversa rápida, divertida e que apresenta os personagens principais da maneira mais fluida possível. Mostra em que eles acreditam e o que será visto no futuro.
Então o capítulo acaba. No seguinte, já nos encontramos um ano depois do primeiro encontro. É então que o mérito do livro começa a aparecer, pois David Nicholls acertou nas diversas formas de mostrar essa passagem do tempo. A primeira coisa importante é que em nenhum momento você fica se perguntando o que aconteceu com Dex ou Em no ano que passou. Às vezes as coisas ficam subentendidas e uma frase é o suficiente para perceber o rumo que levou o gancho deixado no capítulo anterior. Quando isso não ocorre, os diálogos preenchem essa parte sem parecer explicação desnecessária.
O outro ponto importante é como Nicholls utilizou diferentes elementos para mostrar essa passagem do tempo. Cartas, mensagens no celular, cartões postais. Alguns capítulos falavam somente de Em. Outros só do Dex. Na maioria dos casos, as histórias corriam em paralelo e a transição feita com uma sutileza que assusta de tão coesa. Quando os dois estão juntos, a narrativa ganha outro fôlego e renova o que estava sendo construído. Mas o livro não seria nada do que é se não fosse por causa da dupla de protagonistas.
Desde o primeiro capítulo eles se mostram opostos. Sim, esse é o clichê máximo das comédias românticas. Por mais que todos saibam que eles são feitos um para o outro e “os opostos se atraem”, o que mais chama atenção nos dois é a cumplicidade. Provavelmente Dex foi o único amigo que Em fez em toda a vida. E a recíproca é verdadeira. Os dois pensam um no outro o tempo inteiro, do estilo “nossa, aconteceu uma coisa comigo, preciso contar para fulano”. E esse fulano de Dex é a Em. E o fulano de Em é sempre o Dex. Uma cena particularmente bonita é quando, depois de terem brigado e ficado dois anos se encontrando apenas em eventos sociais, os dois reatam a amizade.
A trajetória dos dois também é curiosa. Em se formou em “inglês e história, com louvor, primeira classe”. Dex fez um curso de antropologia meia boca. Os dois sem saber exatamente o que fazer da vida. Emma se embrenha no teatro, se desilude e acaba trabalhando em um restaurante mexicano. Dexter passa um tempo ensinando inglês para italianas, viaja para a Índia e é convidado a apresentar um programa de TV. Enquanto ele progride, ela vê a vida sem esperanças.
É quando o livro faz uma inversão gradual dos dois. Enquanto vemos a carreira dele desmoronar, a dela progride. Nicholls transforma um caminho que, sim, é clichê e já era esperado, em algo bem natural. É esse sentimento, aliás, que guia todo o livro. Não é uma história excepcional, que te faça exclamar pela genialidade do autor. Mas também não é uma história boba, que tenta iludir o leitor. É um livro sincero, você se identifica com os personagens, passa a torcer pelo sucesso deles e se decepciona quando dão alguma mancada.
É uma bela história de amor. Comum, mas muito bem contada. Tinha tudo para ter um final clichê, mas emociona. Os quatro últimos capítulos mostram uma sensibilidade tocante, que, pelo que eu andei lendo por aí, levaram muita gente às lagrimas. Um livro que merece ser lido.
P.S.: Me incomodou um pouco o livro começar com uma página dupla apenas de elogios de vários críticos importantes do mundo. É aquela história: “ou você ama a minha história ou veja o quanto você é burro, porque todo mundo amou”. O livro é realmente bom, não precisava dessa prepotência toda.
P.S. 2, ou melhor, pS2: É o meu segundo livro com a minha e só minha Anne Hathaway na capa. Próximo passo é conseguir um poster em tamanho real dela e pregar no meu teto, pra ver todo dia antes de dormir.
Um dia
David Nicholls
Editora Intrínseca, 2011
411 páginas
Comecei a vida dentro de um laboratório de química, mas não encontrei muitas palavras dentro dos béqueres e erlenmeyers. Fui para o jornalismo em busca de histórias para contar. Elas surgem a cada dia, mas ainda não são minhas. Espero que um dia sejam.