Não gosto muito de cartões, já que os mesmos contêm frases feitas. Não digo que são frases sem sentido, fúteis ou sem sentimento. Mas as considero muito plásticas. Quantas vezes foram utilizadas? Em quantas histórias diferentes? Para quantas ocasiões especiais? Talvez eu esteja apenas justificando minha falta de tato para escolher um cartão. Talvez eu esteja trazendo à tona minha dificuldade para escolher palavras. Mas nada disso realmente importa. A verdade é que os cartões possuem espaço reduzido para se escrever, não concorda? Como eu poderia colocar todas as frases que desejo naquele espaço? Admitirei: a falha é minha. Com certeza. Por que apenas eu, quando é algo tão normal?
Não pense que não tive tempo para comprar um cartão. Vários deles estiveram em minhas mãos, embora nenhum me impressionasse. Por exemplo: a frase “Tenho uma surpresa para você” é realmente muito cabível. Mas talvez a surpresa não seja apenas para você, então já não serve. Deve estar se perguntando nesse momento: “Que surpresa?” Bom, sabe quando você percebe, num momento qualquer de um dia comum que alguém realmente tem importância para você? Quando você sente algo pressionando seu peito de dentro para fora como se o mesmo estivesse prestes a explodir? E aí vem a surpresa: é assim que me sinto. Em certos momentos não classificaria como algo novo. Provavelmente diria que se trata de simples ansiedade. Mas e se você descobre que isso se chama saudade? Daí agora você se lembra que com certeza existe um cartão que une as palavras “surpresa” e “saudade”. Tudo bem, não questionarei.
Tudo estava indo de acordo com o Manual Para Ocasiões Especiais:
1) Procurar um cartão
2) Escolher um cartão bonito
3) Escolher um cartão bonito com uma frase apropriada
Foi quando me deparei com um grande paradigma: o que fazer quando vários cartões possuem frases apropriadas? Comprar todos os cartões nunca foi uma opção, até porque não seria algo muito normal… Mais uma vez eu escolheria apenas um deles? Ficaria confuso e correndo o risco de me arrepender? Foi aí que aconteceu. Quando meus olhos já não conseguiam distinguir as frases, cores e desenhos, quando em minha mente a necessidade de unir todas as frases em um só cartão começava a se fazer presente, eu tive a brilhante idéia. Que tal criar meu próprio cartão? Claro que minha empolgação não durou muito tempo. A falta de habilidade me levaria à criação do mais horrendo dos cartões.
Minhas esperanças esgotavam-se rapidamente. Apenas escolheria um cartão. Nada de mais. Logicamente viria acompanhado de um abraço apertado e as palavras adequadas. E novamente um problema: e se me faltarem as palavras? E se meu abraço não for suficientemente forte? Nunca eternizariam o momento. Nunca fariam sentido de verdade. Mas… e se todas as palavras que não cabem em cartões se unissem em uma carta? E se todos os laços vermelhos, as caixas de presente e as imagens felizes se misturassem numa espiral colorida que pudesse pintar o papel que é branco e sem graça? Por que não?
E agora aqui estou eu, sem saber por qual palavra começar.
Viajo há muito tempo percorrendo vários sistemas bem diferentes. A gravidade do planeta Química exerce forte atração sobre mim, mas o astro chamado Literatura é aquele no qual me sinto mais confortável. Nos entremeios e desencontros do caminho, músicas e histórias me ajudam a não perder o rumo.