Certa manhã, ao despertar de sonhos intranquilos, Gregor Sansa encontrou-se em sua cama metamorfoseado num inseto monstruoso.
Franz Kafka, A Metamorfose
Se meu aniversário fosse há dois meses, esta crônica tomaria um rumo diferente. Na época, eu estava otimista. Falaria sobre minha vida e as perspectivas para o futuro. Contaria sobre os novos passos. Diria que, enfim, estava pronto para me arriscar como nunca estive antes.
Então junho chegou.
Ele veio como uma horda de dementadores. Sugou meus pensamentos felizes e acabou com cada uma das esperanças alimentadas com tanto carinho. Revirou minha síndrome do impostor, me deixou exposto ao mundo. Mostrou o quão bosta sou. Ou pelo menos o quão bosta meu cérebro diz que sou. Duvidei de tudo que acreditava estar fazendo e ainda estou duvidando das minhas capacidades.
Pensar no que vem pela frente só tem me feito ficar pior. Não tenho a mínima ideia do que será da minha vida no próximo mês. Chego aos vinte e oito com a certeza da incerteza do amanhã. Se eu fosse uma pessoa que acredita em astrologia, culparia meu inferno astral. Mas não sou e só posso culpar a mim mesmo. Escrevo essas crônicas de aniversário desde 2011 e não me lembro de estar tão perdido quanto estou hoje. E estar perdido é o que me deixa mais angustiado.
Pode parecer besteira, mas considero meu aniversário como uma virada na vida. A chance de analisar tudo que passou no último ano e tentar mudar. Sempre foi assim. Nos últimos seis anos, consegui fazer isso. Esse ano é a primeira vez que não vou conseguir. Não por falta de tentar, mas por não ter uma perspectiva palpável. Tudo pode acontecer e nada pode acontecer.
Quando falo disso, falo em todos os sentidos da minha vida. Se é o profissional que mais ocupa a minha cabeça no momento, a confusão em minha vida pessoal não fica longe. Pago todos os preços por ser um babaca que não consegue abrir os sentimentos para ninguém. Aos vinte e oito, sinto o peso disso.
Em retrospecto, vejo que não fiz muitas coisas nos últimos 12 meses. Trabalhei para caralho, isso não posso negar. Fiz algumas coisas diferentes do que estava acostumado. Ao mesmo tempo, abandonei tudo o que dizia respeito à minha vida. Parei de escrever no meu blog, parei de fazer os vídeos no meu canal, me encontrei menos com meus amigos, parei de ter ânimo para fazer as coisas que gosto. E a custo de quê? O que ganhei com isso?
Esta crônica é uma tentativa de recomeço. De colocar a casa em ordem para poder planejar o próximo passo. Entender que, se eu quero que meus vinte e oito sejam melhores que meus vinte e sete, preciso lutar minhas próprias batalhas internas. Quando a famosa crise dos talentos vier (e eu sei que ela virá), quero estar preparado para bater de frente com ela.
Se meu aniversário fosse há dois meses, esta crônica tomaria um rumo diferente. A vida aconteceu e, agora, preciso reunir forçar. As mudanças só dependem de mim e estou disposto a abraçar cada uma delas.
Comecei a vida dentro de um laboratório de química, mas não encontrei muitas palavras dentro dos béqueres e erlenmeyers. Fui para o jornalismo em busca de histórias para contar. Elas surgem a cada dia, mas ainda não são minhas. Espero que um dia sejam.