Sentou-se em frente ao notebook e abriu um novo documento em branco. Precisava de um tema, personagens, cenário, diálogos, situações. Qualquer coisa que o fizesse vomitar a crônica do dia e sair de perto daquele lugar o mais rápido possível.

Nos últimos meses, só a simples visão de uma tela vazia deixava-o nervoso. Cada página em branco era uma prova irrefutável do quão inútil era sua vida, forçado a preenchê-lo todos os dias com palavras sem significado e histórias sem alma. Eram personagens amargurados que chegavam aos leitores. Cada linha de diálogo era feita para ser apática. Um perfeito retrato de um homem que não sabia o rumo que daria para a própria vida.

Os leitores não sabiam disso. Seu editor também não. Quem conversasse casualmente com ele acharia que estava tudo certo. Nem os amigos próximos conseguiam perceber o tamanho da dor do escritor, que levou a sério demais a famosa frase de Pessoa. Mas suas crônicas eram entregues no prazo. O dinheiro era recebido no dia certo. A reação do público não podia ser melhor. Na superfície, tudo estava bem.

Por dentro é que tudo desmoronava. Todo dia precisava reunir forças para lutar contra o seu estado de apatia e produzir algo no mínimo decente. Sabia que se não se forçasse a isso, entraria em uma espiral depressiva impossível de sair. Já esteve lá uma vez. Era ruim. Muito ruim. Não queria voltar e sabia que só dependia de si mesmo para isso. Estava tentando.

Sentou-se em frente ao notebook e acabou escrevendo uma crônica em um tom tão pessoal que não teve coragem de enviar para o editor. Fechou o documento sem salvar, pegou a xícara de café e saiu para fumar um cigarro na varanda. Era impossível entregar algo bom naquele dia.